domingo, 27 de setembro de 2009

O Poeta


















O poeta
é uma faca de dois gumes
é a sinceridade teatral
é ouro, ao mesmo tempo estrume
é alegria e mórbido fatal


O poeta é humildade egoísta
é dor, é ferida
Escravo de sua sina
na arte fina
de escrever
...escrever
O que vê com o coração
O que vê com o estômago
e se alimenta com os olhos
...olhos
que descrevem
que imaginam
Visionários
que ocultam
Olhos sinceros que mentem


Henrique Rodrigues Soares

Dores Negras















Dor que trago no meu peito
e arrasta-me em pranto
Conduz-me ao sombrio leito
tirando meu encanto


Encanto que se apaga
desta vida insépida
Meu corpo naufraga
nesta vida céptica


II
Sou tormento para quem me ama
pois apenas na morte acredito
O resto é poeira e lama
de um sonho épico e esquecido


Me castigo cada instante
e gotas de compaixão cai sobre mim
Sou tristeza prestante
da vida espero o fim


III
Não lastimo das dores que já tive
Mas sim, as que ainda vou sentir
Porém, dor maior não há para quem vive
do que no auge da vida partir
As dores da vida são ferozes
mas nenhuma igual a morte precoce


IV
Ah! Lua como te invejo
Brilhas tanto! Brilhas tanto! Na solidão
E daqui te olho como um desamparado


Lua! Lua!
Queria ser como você
solitária sorrindo
Brilha como uma princesa
dando o mínimo de sua realeza
aos pobres mortais


V
Acordei, com dores no corpo
e na alma
E por isso
esses versos doloridos
chorando letras


VI
este fantasma nos assusta
com seu vulto repentino
como o fim de um destino
de dor tragédias e lutas


ele vem com sua armadura
crua, consumidora e inatíngivel
seus olhos uma luz invencível
corta as barreiras com argúcia
sua passadas são frias, são lentas,
são guerreiras de estrada.


Henrique Rodrigues Soares

As duas pombinhas




















a pombinha branca
e a pombinha cinza
voando pelo céu
num primeiro vôo de liberdade


a pombinha branca
queria voar para bem alto
mas, tinha medo de suas pequenas asas não aguentar
a pombinha cinza
era realista
voava até o meio do caminho
sem pensar no desconhecido


a pombinha branca
tinha os olhos fascinados
pelo o brilho do infinito
já a pombinha cinza,
essa, voava baixo
com os pés perto do chão


um dia, a pombinha branca voou
e nunca mais voltou
viajou pelos seus sonhos
de céus, mares e terras
mas, a pombinha cinza, ficou
pela terra a fazer seu ninho
que nunca mais deixou.


Henrique Rodrigues Soares
À Minhas Primas Edvânia e Edisandra.

sábado, 26 de setembro de 2009

Clandestino























A noite consome
os homens
com sua fome infinita
A noite liquida
os homens
com sua líquida morbidez
A noite nos cega
tortura e enlouquece
A noite nos embebeda
com sua volúpia
e nos cobre
com seu manto


Nos excita
com seu mistério
revestido de cortinas
Nos domina
com sua limitação
nos amarra
a um caís... uma prisão
Sua beleza é superficial
O seu encanto é carnal
Tão carnal quanto a dor


Um mar de ilusões
me afogou
Um mar de decepções
me cobriu
e nas suas sombras
escondi o meu rosto
A noite chegou, devargazinho,
espalhando-se por todos os cantos
numa procissão de mortos e feridos
A noite absorveu toda luz
que havia naquele lugar
A noite como um monstro horrendo e hediondo
A noite numa brisa nos adormece e petrifica


Clandestino
num barco que não é meu
num mar que não é meu
num tempo que não é meu
Naveguei numa transpiração suave
Estou calmo, minha respiração tranquila
Meus olhos virgens de choro
agora transbordam sem parar
Bebo minhas lágrimas
Nado em minhas lágrimas
Este soro vem me curar
do mal que floresce no meu coração


Cavalgo numa estrela, pura, solitária
Minha boca está faminta, está sedenta
Meus ouvidos imploram por este alimento
Quero silêncio!
Quero sussurros da noite
Quero ouvir
Preciso ouvir!
De alguém, algum ser
neste planeta egoísta e solitário
-Eu te amo!
Preciso, muito ouvir estas palavras
nem que quase imperceptíveis
Peço pela última vez
-Eu te amo!


Clandestino louco dos mares
Abordei uma terra que não é minha
Não pedi para entrar
Entrei!... Entrei por sua densa floresta
com meu poder de fogo
Existe um vulcão dentro de mim
pedindo socorro e carinho
sua fúria, sua força está morrendo
apagado pelo medo dos teus olhos
pela rejeição dos teus braços


Esta noite tem me despido
As dúvida me consumido
Milhões de pessoas me rodeiam
com seus desejos
E suas mãos me apalpam
com seus espinhos
Olho os fantasmas
Olho os cavaleiros da noite
que reinam no absurdo das estrelas
em seu eterno caminhar.


Henrique Rodrigues Soares

A Cama















santuário de meditação
o oráculo de quem ama.
Meu esconderijo... solidão
onde minha dor inflama.


Onde nasci e morri
tantas vezes... e tanto
enfermo quieto sofri
neste que é meu canto.



Henrique Rodrigues Soares

Pensamentos




















Toda carne é impura
se todo desejo for impuro.
Pois toda carne deseja o que não lhe pertence.
Toda carne quer dominar, quer possuir...
As flores respiram no jardim
o ar impuro dos corpos
que se enganam, se estrupam,
dizendo está se amando,
porém, tudo é desejo...
apenas desejo.


Desejo é como o vento.
Vem...se achega como uma brisa
depois vira furacão e passa violentamente
deixando os vestígios de sua erosão.


Henrique Rodrigues Soares

 






domingo, 20 de setembro de 2009

Rimas e métrica















Não metrifico versos
não me preocupo com rimas
Pois a poesia é livre,
e ela sai como quer


Sou apenas seu transporte
Sou apenas o oceano onde desagua suas águas
E ela, um cavalo selvagem
que cavalga como a natureza
impulsiva e indomável.


Henrique Rodrigues Soares

Sensações

















Não ligue para as televisões ligadas
não ligue para os telefones chamando
ouça apenas o som
ressoando lá fora,
o som do mundo vivo.
Não! para este mundo morto das televisões.
Não! para as vozes sem rosto dos telefones.
Não! para estas pessoas que te cercam
com seus pensamentos codificados.


Sim! quero ouvir...
Quero ouvir os ruídos dos insetos
quero ouvir o marulhar das águas do mar
quero ouvir o eco do vento
passear pela madrugada solitária
quero ouvir pássaros, bichos
entrando e saindo nos meus tímpanos.


Não! para o som metálico e correto das máquinas.


Apenas, quero ouvir
O som sem sentido
que dá sentido ao mundo.


Henrique Rodrigues Soares

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Romaria Lírica



Algumas pessoas amam
Alguns seres vegetam
Alguns caminham na chuva
Alguns enxergam na escuridão


Existe pessoas que sentam
e esperam as folhas caírem
Há pessoas que andam
e há também pessoas que dormem
no seu sono de aniquilação


Veja os rostos submissos
as mãos que agradecem
os empalhados sorrisos
que enchem teu ego
Veja o medo da morte
que cerca os mortos-vivos
Veja os olhares preconceituosos
dos que nasceram no preconceito
morrem cobertos por ele


Não olhe as flores que nascem com o despertar do sol
Não olhe as plantas dançarem, sorrirem com a chuva
Não olhe os pássaros cantarem ao vento
pois isto, é tão passageiro


Veja apenas o que te preocupa
Pois o que falamos é o resumo de muitas vidas.


Henrique Rodrigues Soares

sábado, 12 de setembro de 2009

Relicário das Dores




















Um rosto alegre inocente de criança
cheia de sonhos e esperanças
cercada de amor e de presentes.
Ela não sabe o que tem pela frente
quando estreitarem o seu caminho
e descobrir que neste mar de rosas
também existe espinhos.


O tempo passa, ela cresce...
Os seus sonhos se dissolvem.
Seus heróis desistem de existir.
A atenção que lhe era dispensada
cada vez mais é subtraída.
Então procura um Salvador.
Então procura uma mentira
que lhe explique tudo.
Tudo que seus olhos podem ver.
Tudo que suas mãos podem pegar.
Tudo que lhe é proibido
pelas leis divinamente humanas.


Então, compreende que liberdade é um discurso.
E que todos estão presos a alguma coisa.
Descobre que fracasso não é segredo
que se guarde dentro de um quarto.
Descobre que nosso curso já foi traçado.


Henrique Rodrigues Soares

Sociedade dos Eremitas

















Sou uma pétala num jardim
sou uma gota d'água no mar
sou um grão de areia na praia
sou tão pequeno... tão frágil
e tão soberbo
que as vezes
audaciosos como somos
julgamos ao mundo e a Deus.


Nos achamos um petardo, uma bomba nuclear
nossas línguas afiadas destruindo a tudo e a todos
a língua? a ponte? ou a destruição da amizade?


E a raça humana, superior aos outros seres vivos
não consegue viver sem o ser morto, sem o menor molusco
mas mesmo assim, nos achamos poderosos, sábios, deuses
e não entendemos a nós mesmos.
Nos enganamos na ânsia de esconder o medo, a angústia
humana de viver só
pois o homem vive só...
só ele que não sabe
-Por favor, não diga para ele.


Estamos cercados de pessoas
e as pisamos como pedras que ficam ao caminho.
Fingimos não vê-las ou não vemos
pois nosso orgulho cegou nossos olhos.


Então me pergunto,
até que dia
o homem vai acreditar
que ele é social?


Henrique Rodrigues Soares - Poesia de abertura do livro Sociedade dos Eremitas 1990/1996